Confrontar, Pensar e Refletir

Os passos são a dinâmica básica da caminhada. Sem eles o percurso é ideia, intenção e assim permanecerá, isto é, não será, não se realizará e não permitirá o trânsito pelo caminho e todas as suas nuances, descobertas, incômodos e aprendizados. Mas também não se trata de qualquer passo. Uma caminhada pode ser uma jornada rica em experiências se os passos são coordenados, pensados a partir de uma análise e de uma compreensão de onde se pisa, por onde se passa, onde se quer chegar. Assim é preciso que o pensamento que coordena cada passo possa alimentar-se de uma análise capaz de saber a respeito do caminhante, das pernas, dos pés, dos pisos, do percurso e das chegadas em cada etapa.

Como os gestos das mãos e dos dedos das mãos são a dinâmica da execução de um objeto, uma escultura, por exemplo ou de uma comida a ser servida. Mas a capacidade de gesticular também, neste caso, não pode ser a esmo como faz o recém-nascido com gestos que ainda se encerram em si mesmo. Tal capacidade também deve ser acompanhada de um pensamento que conhece os ingredientes e o seu modo de manejo e, por conseguinte, todo o conjunto de gestos coordenados pelo pensamento que conhece os objetos será orientado pela capacidade de análise de cada etapa, de cada mistura, de cada fase do processo, com o fim de conseguir, quer a escultura, quer o alimento final.

É tempo de reflexão! É tempo de debate e de busca de esclarecimento! O pensamento que busca e se orienta pela emancipação diante do mundo, que pretende reconhecer e minimizar preconceitos e tabus para se livrar de amarras que impedem esta busca, precisa ser mantido em exercício diante da realidade e alimentado pela capacidade de análise cuidadosa e crítica diante da própria dialética entre o sujeito e o objeto.

A palavra, como signo - que toma o lugar do objeto - nos serve de referência fundamental para a dinâmica e para a estruturação do pensamento. O pensamento é um discurso subjetivo, constitui linguagem que, pela palavra, internaliza o real pelo nome dos objetos e nos ajuda a organizar e tornar a realidade cognoscível. A palavra é constituída nas relações, advém da cultura e assim temos a dialética entre a objetividade da cultura e das relações e a dinâmica subjetiva da formação do pensamento do sujeito, da subjetividade. Indivíduo e cultura se encontram, se deparam, se confrontam pelos signos.

Exercitar o uso das palavras nos mais diferentes contextos é expandir a possibilidade do pensamento. O uso da palavra é como o passo e como o gesto. Permite ao sujeito a construção de algo. No entanto a palavra encerrada e repetida em si mesma, limita o seu significado. É preciso que a palavra seja colocada em movimento. Esse movimento da palavra ínsita e instiga o pensamento que, orientado pela capacidade analítica (acuidade do reconhecimento das relações pela sensibilidade perceptiva e lógica) que busca compreender o sentido e o contexto de cada palavra, em cada ocasião, em cada discurso e pode perseguir o entendimento do sentido e do significado do pensamento, de si como sujeito e do outro, quando advém de um interlocutor. Todo esse movimento é fonte de enriquecimento pois tira a palavra da condição de expressão em si mesmo que limita seu significado.

O texto escrito é um destes movimentos possíveis nos quais, toda esta possibilidade dialética de expansão do sentido e do significado das palavras articuladas e que intencionam comunicar algo, guarda um enorme potencial de expansão da compreensão de si mesmo (aquilo que quero descrever e comunicar – meu processo de produzir o pensamento analítico e articulado) e do outro, o leitor que necessita ter em mãos, do modo mais claro possível os elementos de meus pensamento para que possa compreendê-lo. Promover, constantemente o exercício intelectivo, crítico de trabalhar com as palavras e, portanto, com o pensamento, analiticamente orientado, de modo a elaborar de modo claro um pensamento e um conhecimento; ordenar as ideias do modo a transmitir e caminhar na direção da construção de um discurso que traduz o pensamento a um outro que pode interpretá-lo, decodifica-lo, esclarecer-se, contrapor-se é promover o diálogo fundamental para a cultura e seu processo civilizatório. É enfim, entender que se trata de uma atividade humana por excelência: refletir, orientar o pensamento, expressá-lo por signos, palavras, elementos que integram indivíduo e cultura, eu e o outro. É buscar o esclarecimento, o clareamento do que possa ser obscuro nas relações dos indivíduos entre si e entre eles e o mundo. Tão necessário hoje e sempre!

A Thesis, de modo simples, localizado é a contribuição da Faculdade Cantareira a esse enorme desafio. Nossa contribuição com esse movimento que guarda um processo de humanização contínua e gradativa, tão ameaçado em tantos momentos. O pensamento, as palavras, o texto, o artigo, a apresentação de ideias e dados a respeito do real, de modo público, de maneira aberta, para a discussão, para a reflexão, para o debate, para o aprendizado e para novos pensamentos e novas possibilidades do real e de esclarecimento a seu respeito.

Queremos unir esse nosso espaço, esse nosso esforço e contribuição a todos os outros espaços e esforços de emancipação do indivíduo e da sociedade, na pessoa dos pesquisadores, alunos e professores que se debruçam para organizar as palavras e escreverem artigos e ensaios que possam refletir a realidade na perspectiva da ciência, do conteúdo acadêmico. Essa é a nossa contribuição, tem sido nosso esforço mesmo em tempos difíceis e por vezes avesso a esse diálogo tão importante.

Nosso agradecimento à Faculdade Cantareira, aos alunos, professores, pesquisadores e articulistas que insistem em propor a manutenção desta caminhada a passos delicados e à construção da escultura da cultura e do conhecimento a gestos atentos.

 

Otávio Augusto de Melo

Conselho Editorial da Revista Thesis

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